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Enquanto a presidente do Conselho Constitucional (CC), Lúcia Ribeiro, apresentava, na manhã desta sexta-feira, 24 de Novembro, o acórdão número 61/CC/2023, atinente à validação dos Resultados das eleições autárquicas 2023, um carro blindado da Polícia da República de Moçambique (PRM) foi estacionar à entrada das instalações onde funciona a Televisão Sucesso, na cidade de Maputo.

De acordo com uma peça noticiosa veiculada pela TV Sucesso, o blindado, com agentes da Unidade de Intervenção Rápida (UIR), uma força de elite da PRM, bloqueou a entrada que dá acesso ao edifício onde funciona esta estação televisiva, durante o momento em que a presidente do CC lia o acórdão 61/CC/2023. Não se conhecem as razões que levaram a este acto, mas, de acordo com a peça da Tv Sucesso, quando questionados, os agentes responderam que estavam em actividade de rotina.

Este incidente surge numa altura em que este órgão de comunicação tem sido ostracizado por alguns sectores da sociedade moçambicana, pela cobertura jornalística que fez às recentes eleições autárquicas, sobretudo a partir da longa noite de votação, a 11 de Outubro, quando expôs várias irregularidades susceptíveis de consubstanciar fraude eleitoral a favor do partido no poder, a Frelimo.

O presidente do Conselho de Administração (PCA) da Televisão, Gabriel Júnior, tem vindo a sofrer ameaças de morte. “Acho que está na hora de pedir que vocês orem por mim porque, nas últimas duas semanas, eu tenho recebido ameaças de morte. Pensei que fosse passageiro, mas, a cada dia que passa, a pressão das ameaças começa a ser maior”, disse Gabriel Júnior, no dia 12 de Novembro, no seu habitual programa aos domingos, denominado “Moçambique em Concerto”.

Posicionamento

Dado o contexto e o momento em que ocorre a colocação de uma viatura blindada em frente do edifício da Tv Sucesso, o MISA Moçambique chama atenção para não se levar o caso de ânimo leve. Longe de ser uma simples coincidência[1], envolvendo agentes da Polícia inadvertidos sobre o contexto em curso, esta pode ser uma acção intencionada para enviar uma mensagem de que alguém está atento ao trabalho que a Televisão está a desenvolver, ainda mais num dia de anúncio de resultados eleitorais largamente contestados, em que o tipo de cobertura jornalística pode ser instrumental para o tipo de reacção popular ao que a Tv chamou por “juízo final”.

Assim, no lugar de um acto desinteressado, este acontecimento pouco comum pode configurar uma ameaça contra a liberdade de imprensa e de expressão. Aliás, numa altura em que o PCA da televisão já vem sofrendo ameaças, associadas à foma crítica como o órgão fez a cobertura das eleições, actos como a colocação de uma viatura armada em frente à estação televisiva adensam, ainda mais, o sentimento de intimidação contra o órgão.

O MISA Moçambique repudia e desencoraja violações contra a liberdade de imprensa, sejam de que natureza elas forem, incluindo intimidações com recurso ao aparato repressivo do Estado. O Estado de Direito Democrático, que Moçambique persegue, não se compadece com recados como estacionamento de viaturas armadas em frente a órgãos de comunicação. O exercício da liberdade de imprensa pressupõe, entre outros, o direito que os jornalistas e os órgãos de comunicação social têm de operar num ambiente livre de qualquer tipo de pressões, mesmo quando essa faculdade de informar é exercida de forma particularmente incómoda.

Colocar viaturas armadas em frente de órgãos de comunicação social que não representam nenhuma ameaça senao o cumprimento de uma das missões centrais da imprensa, vai contra todos os alicerces das democracias e não pode, de forma alguma, ser tolerada.

 

[1] Uma actividade de rotina em que a Polícia bloqueia, com blindando, a entrada de uma televisão já sob ameaças, não deixaria de ser uma coicidência infeliz, que a corporação deveria, a todo o custo, evitar.