Published April 17, 2024
Categories: Intervenções

Não é só a crise humanitária causada pela insurgência que as mulheres enfrentam, em Cabo Delgado. Por detrás dos números sobre deslocações, há uma outra tragédia que se abate sobre elas: o assédio e violência sexual. É o que revela uma reportagem produzida com o apoio do MISA Moçambique (Capítulo Moçambicano do Instituto de Comunicação Social da África Austral) e o SEKELEKANI (Centro de Estudos e Pesquisa de Comunicação), no âmbito do Programa IGUAL.

Com a degradação da situação de segurança, em Cabo Delgado, nos últimos tempos, com incidência entre Fevereiro e Março últimos, as notícias sobre a crise humanitária, no Norte de Moçambique, voltaram a ganhar destaque. Não é para menos. A província, particularmente a zona sul, voltou a atingir um novo ápice com milhares de deslocados, sobretudo do distrito de Chúre, buscando refúgio em locais como na vizinha província de Nampula.

Só de 8 de Fevereiro a 3 de Março últimos, os ataques armados forçaram a deslocação de perto de 100 mil pessoas entre de Chiúre (91.239) e Macomia (5.719), indicam dados da Organização Internacional das Migrações (OIM). Desde o início da guerra, em 2017, as mulheres e crianças têm sido a maioria da população deslocada. A título de exemplo, das mais de 80 mil pessoas deslocadas entre 22 de Dezembro de 2023 e 27 de Fevereiro de 2024, 41.383, o equivalente a 61% do total, foram crianças; 16.664 mulheres (24%), contra 10.109 homens (15%).

Este perfil demográfico ressalta a vulnerabilidade extrema das crianças e das mulheres em meio à crise que se arrasta há mais de seis anos, em Cabo Delgado. Com efeito, ainda que todos os deslocados enfrentem desafios significativos, como no acesso ao abrigo, a alimentação, a saúde e a educação, as mulheres estão entre os grupos mais vulneráveis, estando sujeitas a mais uma realidade sombria e perturbadora: o assédio e abuso sexual.

É o que revela uma reportagem produzida com o apoio do MISA Moçambique e o SEKELEKANI, no âmbito do Programa IGUAL, que é implementado pelo Centro de Aprendizagem e Capacitação da Sociedade Civil (CESC), com apoio do Reino dos Países Baixos.  Embora divulgada em finais do ano passado, a reportagem continua actual e pertinente, numa altura em que a província voltou a estar mergulhada em mais uma crise humanitária.

“Arrancou-me a roupa interior e penetrou-me”

Os relatos, a partir do terreno, são arrepiantes. “Chamou-me aqui em casa e levou-me até à residência dele. Ameaçou-me. Caso eu gritasse, poderia decapitar-me. Arrancou-me a roupa interior e penetrou-me”, relevou uma rapariga de apenas oito de idade, a viver em Ancuabe, depois de ter abandonado Mocímboa da Praia entrevistadas, um dos distritos mais afectados pela guerra.

De Janeiro a Outubro de 2023, quando a reportagem foi divulgada, haviam sido registados, só nos distritos de Ancuabe e Metuge, 50 casos de violência contra deslocadas, alguns deles alegadamente cometidos por líderes ou agentes humanitários nas aldeias de reassentamento. Em 2022, foram abertos, em Cabo Delgado, pelo menos 25 processos de violência e abusos, alguns deles envolvendo assistentes humanitários e líderes das aldeias de reassentamento.

Por outro lado, a reportagem revela casos de mulheres que, devido a carência alimentar, recorrem à prostituição para a sua sobrevivência. Saiba mais em https://www.dw.com/pt-002/cabo-delgado-famílias-denunciam-abusos-a-raparigas-deslocadas/a-67169066

Maputo, 17 de Abril de 2024

Mais artigos