O MISA Moçambique tomou conhecimento, com preocupação, de um episódio em que o partido Frelimo condicionou, na semana passada, na sua sede nacional, em Maputo, o trabalho de profissionais de comunicação social, ao restringir a presença de operadores de câmera numa conferência de imprensa por si convocada.
O caso deu-se no dia 13 de Julho de 2023, quando o partido Frelimo convidou vários órgãos de comunicação social para uma conferência de imprensa que tinha por objectivo anunciar a eleição de cabeças de lista para as eleições de 11 de Outubro nas 65 autarquias do país.
No entanto, de acordo com os dados recolhidos pelo MISA junto de vários profissionais de comunicação social que responderam ao convite, uma vez chegados à sede nacional da Frelimo, estes foram colhidos, de surpresa, com uma informação dando conta de que os operadores de câmera não teriam acesso à sala onde a porta-voz do partido, Ludmila Maguni, iria dar o ponto da situação sobre as eleições internas, que estavam agendadas para 15 a 17 de Julho.
Assim, estes profissionais de comunicação ficaram do lado de fora, sem registar a conferência de imprensa. Apenas seus colegas de escrita tiveram acesso à sala. Quem captou as imagens foi um operador de câmera ao serviço do partido Frelimo, que depois distribuiu as gravações, em flash (dispositivo de memória), para os profissionais de comunicação social.
Posicionamento
O MISA Moçambique repudia esta atitude do partido Frelimo, que constitui uma interferência e restrição ao livre exercício do jornalismo. O livre acesso e permanência em lugares onde se torne necessário o exercício da profissão (ainda que, neste caso, não seja, necessariamente, um lugar público, conforme a Lei 18/91 de 10 de Agosto), é um dos direitos consagrados aos jornalistas, conforme previsto na alínea a), do número 1 do Artigo 27, da Lei de Imprensa.
Aliás, a alínea b), do mesmo artigo, determina que, no exercício da sua função, o jornalista goza do direito de não ser detido, afastado ou, por qualquer forma, impedido de desempenhar a respectiva missão no local onde seja necessária à sua presença como profissional de informação, nos limites previstos na lei.
O MISA Moçambique lembra, à Frelimo e aos demais partidos políticos, que os órgãos televisivos enviaram, à conferência convocada pelo partido, além de jornalistas de escrita, os operadores de câmera por estes fazerem parte do processo de produção jornalísticas. O trabalho dos repórteres de imagem é, pois, uma das componentes imprescindíveis da reportagem em televisão, em conjugação com o realizado pelos repórteres tradicionais.
O saber fazer filmagens institucionais ou de outra natureza não é igual a fazer registos de natureza jornalística e não assume igual responsabilidade profissional. Nas filmagens jornalísticas, há regras próprias por observar, que incluem enquadramentos, ângulos e planos de corte específicos, conforme a orientação editorial de cada órgão de comunicação.
Ao convidar aos jornalistas para uma conferência de imprensa, o partido Frelimo estava consciente de que estava a aplicar uma estratégia de assessoria de imprensa sob a qual, nos termos das boas práticas em contextos democráticos, os jornalistas devem ter a total liberdade de acesso, registo e tratamento da informação. Ao produzir a sua própria gravação de imagem, restringindo o acesso aos operadores de imagem profissionais, o partido Frelimo condicionou a cobertura jornalísticas, violando os princípios de Liberdade de Imprensa.
O MISA tem a certeza de que a equipe de comunicação do partido Frelimo tem o total conhecimento de que, em situações em que pretende ter o total controlo da informação produzida e emitida pela instituição, deve produzir o seu próprio material, difundir nos seus canais e fazer uma divulgação nos media profissionais, mediante pagamento e com a clara indicação de que tal material é propaganda sob sua responsabilidade. Ao convidar jornalistas, através de conferência de imprensa, o Partido Frelimo deveria ter prescindo do poder de controlo editorial sobre os conteúdos e das imagens da sala de conferencia de imprensa e tendo o feito, tal configura um mecanismo evidente de controlo dos conteúdos editoriais produzidos pelo jornalismo profissional.
Enquanto organização de defesa das liberdades de imprensa e de expressão e do direito à informação, o MISA Moçambique considera inaceitável esta interferência do partido Frelimo no trabalho jornalístico. Por isso, o MISA desencoraja este e qualquer acto que condicione o trabalho dos profissionais de comunicação social e que coloque em causa a liberdade de imprensa, particularmente o livre acesso e permanência, pelos jornalistas, a lugares onde se torne necessário o exercício da sua profissão, que deve ser reconhecida e protegida como um pilar fundamental da democracia.
Maputo, 20 de Julho de 2022