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Promovendo a Liberdade de Expressão na África Austral

 

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O MISA Moçambique tomou conhecimento da ocorrência, durante o recém-terminado recenseamento eleitoral, de um acto de violação contra a Liberdade de Imprensa, em Moçambique. A vítima foi o repórter Atanásio Vasco Amado, da Rádio Comunitária Ehale, no distrito de Nacala-à-Velha, província de Nampula.

 

Tudo começou quando o repórter recebeu denúncias dos partidos Renamo e MDM sobre suposta produção de “listas de prioridade” e declarações de residência, actos alegadamente protagonizados por secretários de bairro do partido Frelimo, com vista a facilitar a inscrição de membros do partido no poder.

Para apurar as alegações, o repórter deslocou-se ao terreno. No entanto, logo no primeiro Posto de Recenseamento, em Coutinho, localidade de Namalala, Posto Administrativo Sede de Nacala-à-Velha, Atanásio Amado foi alvo de intimidação e coerção. O primeiro protagonista das intimidações foi um secretário de bairro pelo partido Frelimo que, na ocasião, também desempenhava a função de fiscal deste partido, no referido Posto de Recenseamento. O secretário em causa começou por solicitar, do repórter, credencial emitida pelo Secretariado Técnico de Administração Eleitoral.

Entretanto, o repórter não possuía credencial emitida pelos órgãos eleitorais. Ao MISA, explicou que uma solicitação de credenciação efectuada pela sua Rádio estava sem resposta há bastante tempo na Comissão Distrital de Eleições de Nacala-à-Velha. Mesmo assim, o repórter apresentou credencial o crachá emitidos pelo seu órgão de comunicação. Mas o representante do partido Frelimo não considerou os documentos. Pelo contrário, solicitou os agentes da Polícia posicionados no Posto de Recenseamento, que retiveram o repórter por cerca de cinco horas.

Tempos depois, o repórter foi encaminhado ao Comando Distrital da Polícia da República de Moçambique (PRM), em Nacala-à-Velha, onde, ao que contou ao MISA, foi conjuntamente interrogado pelo director distrital do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE), pelo director distrital do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), e pelo comandante distrital da PRM. De acordo com o relato do repórter, o interrogatório aconteceu no gabinete do comandante. Na ocasião, Atanásio Amado terá sido informado que dever-lhe-ia ser instaurado um processo criminal, mas não o fizeram por ser conhecido como repórter da Rádio Comunitária local.

Durante o longo período em que esteve nas mãos da Polícia, o repórter viu seu celular confiscado e foi obrigado a apagar as imagens que havia registado no Posto de Recenseamento. Igualmente, foi advertido a não voltar a fazer cobertura sem credencial dos órgãos eleitorais. Entretanto, no mesmo dia, o repórter foi solicitado ao gabinete do administrador de Nacala-à-Velha, mas o encontro foi adiado antes da hora previamente marcada. Sendo uma sexta-feira, a reunião foi remarcada para a segunda-feira seguinte, mas o encontro foi, novamente, adiado para uma data a ser anunciada, sem que houvesse uma agenda definida para o mesmo.

Posicionamento

Estes actos desprezíveis, cometidos pelo representante do partido Frelimo e autoridades de Estado, em Nacala-à-Velha, representam uma séria ameaça contra a Liberdade de Imprensa. Embora considere importante a credenciação de jornalistas pelos órgãos eleitorais, o MISA entende que tal não pode servir como condição para o exercício da Liberdade de Imprensa. Tal como alertamos, em Maio de 2023, condicionar a cobertura de qualquer actividade relacionada as eleições à credenciação por órgãos de gestão eleitoral é uma grave violação à Lei 18/91 de 10 de Agosto (Lei de Imprensa) que estabelece, no seu artigo 27, o livre acesso e permanência em lugares públicos onde se torne necessário o exercício da profissão.

Isto contraria, igualmente, o disposto na alínea b) do artigo em referência, que preconiza que o jornalista não deve ser detido, afastado ou, por qualquer forma, impedido de desempenhar a respectiva missão no local onde seja necessária a sua presença como profissional de informação.

Por isso, o MISA condena esta e qualquer outra forma de limitação da Liberdade de Imprensa, no país. O MISA lamenta, ainda, o envolvimento de dirigentes e outros funcionários e agentes do Estado nas violações contra jornalistas. Neste momento em que a credenciação voltou a ser usada como argumento para limitar o exercício das Liberdade de Imprensa, o MISA reitera que, em muitos casos, a credencial é útil para garantir o acesso dos jornalistas a áreas restritas ou informações exclusivas, o que não é o caso dos processos eleitorais que, pela sua natureza, requerem uma ampla “publicidade” de todas as fases, a bem da transparência desses processos. 

Mais do que a condenação, o MISA insta a quem é de direito a tomar medidas visando a responsabilização dos protagonistas desta mais uma violação contra a Liberdade de Imprensa, em Moçambique. O que é inaceitável é que casos de violência, intimidação e coerção contra profissionais da comunicação continuem a ocorrer impunemente no país.  A intimidação, a retenção de repórteres, o confisco de equipamento e a pressão para eliminação de evidências são práticas que não podem ser toleradas numa sociedade democrática.

Por isso, não nos cansaremos de lembrar que a Liberdade de Imprensa é um pilar fundamental da democracia, garantindo o acesso à informação e o direito dos cidadãos de serem informados de maneira livre, imparcial e transparente. Neste sentido, qualquer acto que vise restringir a Liberdade de Imprensa é mais do que uma afronta contra jornalistas. É, isso sim, uma afronta também à democracia e aos direitos humanos.

Maputo, aos 07 de Maio de 2024

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