O MISA-MOÇAMBIQUE tem acompanhado com profunda preocupação o desenrolar do processo-crime em que Amade Abubacar e Germano Adriano, dois Jornalistas afectos ao Instituto de Comunicação Social (ICS), delegação de Cabo-Delgado, são acusados de crimes de instigação pública a um crime com uso de meios informáticos e injúria contra agentes da ordem pública.
Amade Abubacar foi detido no dia 5 de Janeiro de 2019, quando se encontrava a reportar sobre um grupo de cidadãos civis chegados à vila de Macomia, depois de terem sido evacuados de uma aldeia vizinha que tinha sido alvo de um ataque dos grupos armados que desde Outubro de 2017 desestabilizam a província de Cabo Delgado. Após a sua detenção, Amade Abubacar foi levado para o quartel das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) em Mueda, onde permaneceu 12 dias sem ser presente ao Juiz de Instrução Criminal e consequente legalização (ou não) da sua prisão preventiva, ao arrepio da Lei que estabelece o prazo de 48 horas para esse efeito.
O MISA-Moçambique tem informações credíveis provindas de diversas fontes e largamente difundidas nos media, segundo as quais, enquanto esteve sob custódia dos militares, no quartel de Mueda, Amade Abubacar foi vítima de tortura.
Por sua vez, Germano Adriano foi detido no dia 15 de Fevereiro deste ano, acusado de associação para delinquir, nos mesmos crimes de que é acusado Amade Abubacar. Antes da sua detenção, Germano foi informado, pelos seus superiores hierárquicos (do ICS), de que o seu pedido de transferência tinha sido aprovado, pelo que deveria ir buscar a respectiva guia nas instalações do Intituto de Comunicação Social (ICS) em Macomia. Na verdade, no lugar desta ser uma informação verdadeira, tratava-se de uma armadilha; não havia guia nenhuma de transferência. Em colaboração com as autoridades policiais, a direcção do ICS em Macomia havia engendrado um esquema que facilitasse a detenção de Germano.
O que mais inquieta ao MISA MOÇAMBIQUE é o facto de o julgamento destes dois profissionais estar a ser copiosamente atrasado com recurso a manobras dilatórias que visam perpetuar a sua permanência na situação da detenção.
Ora, se, na verdade, estivéssemos perante o cometimento dos tais crimes de que são acusados os dois jornalistas, seria suposto que as entidades que os detiveram e os acusam, ao invés de artimanhas dilatórias, promovessem o seu julgamento sem demora, para poderem demonstrar e provar os pretensos ilícitos criminais.
Entretanto, por se tratar de infundadas acusações, motivadas por interesses estranhos e obscuros, as audiências de produção de provas já foram adiadas em duas ocasiões, sendo uma por alegada confusão na fixação da data exacta da realização da sessão e outra por alegada ausência do representante do Ministério Públicoe um dos declarantes.
Conforme se pode depreender, as mais diversificadas justificações para o protelamento das sessões de produção e provas e por conseguinte da realização do julgamento, para além de legalmente descabidas, estão imbuídas de elevada carga de má-fé que em nada abonam as nossas instituições de Justiça e não só.
Mais do que isso, estão aqui postos em causa os mais básicos direitos e garantias dos cidadãos, quais sejam, o direito à liberdade, à justiça em tempo útil e ao pleno exercício da sua defesa.
Por outro lado, considerando as circunstâncias em que os dois jornalistas foram detidos, isto é, no exercício ou por causa das suas funções, o Estado moçambicano através dos seus agentes envolvidos, estão em grave atropelo às liberdades de expressão e de imprensa e o direito à informação a que está vinculado pela Constituição da República, legislação ordinária e Convenções Internacionais de que é signatário.
Os pertences dos dois jornalistas, confiscados no acto da sua detenção, que incluem documentos pessoais de identificação e cartões bancários, não lhes estão a ser devolvidos, apesar de promessas feitas nesse sentido.
Neste sentido, o MISA MOÇAMBIQUE exige a intervenção das entidades competentes de direito, com especial enfoque à Procuradoria-Geral da República, Provedor da Justiça, Assembleia da República, com vista à reposição da legalidade flagrantemente violada.